Promover a educação médica continuada e a difusão de conhecimentos na área de Alergia e Imunologia, fortalecer o exercício profissional com excelência da especialidade de Alergia e Imunologia nas esferas pública e privada e divulgar para a sociedade a importância da prevenção e tratamento de doenças alérgicas e imunodeficiências.

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Boletim ASBAI Edição Nº 98 25 de fevereiro de 2025

EDITORIAL | Doenças raras no Brasil: avanços e desafios

Mais de 30 centros de referência ou serviços de atenção especializada em DRs já foram habilitados pelo Ministério da Saúde

Por Faradiba Sarquis Serpa*

O Dia Mundial das Doenças Raras é celebrado anualmente em 28 de fevereiro (ou 29 em anos bissextos). Desde sua criação em 2008, essa data se tornou fundamental para dar visibilidade aos desafios enfrentados pelos pacientes e profissionais de saúde no diagnóstico, tratamento e acompanhamento dessas condições. Estima-se que existam entre seis e oito mil doenças raras (DRs), atingindo 8% a 10% da população mundial, o que corresponde a aproximadamente 300 milhões de pessoas. No Brasil, considera-se rara a doença que afeta até 65 a cada 100 mil indivíduos. Estima-se que sete a 16,2 milhões de brasileiros sejam portadores de uma dessas condições, o que gera um impacto significativo no sistema de saúde.

Cerca de 72% das doenças raras (DRs) têm origem genética, mas também podem ser causadas por fatores ambientais, infecciosos, imunológicos e outros. Compõem esse grupo de doenças as anomalias congênitas, os erros inatos do metabolismo, os erros inatos da imunidade e as deficiências intelectuais. Os erros inatos da imunidade representam um grupo importante de DRs cujos diagnósticos são um grande desafio, pois são doenças pouco conhecidas pelos profissionais de saúde e os sintomas muitas vezes são inespecíficos. Isso faz com que os pacientes enfrentem um longo itinerário de consultas e exames antes do diagnóstico. Após essa etapa, ainda precisam superar diversas barreiras para conseguir o tratamento adequado, que exige acompanhamento multiprofissional, acesso a medicamentos de alto custo e exames periódicos.

A triagem neonatal representa um marco para o avanço das pesquisas em doenças raras, sendo o primeiro passo para a identificação precoce de condições que, sem diagnóstico oportuno, podem levar a desfechos graves e até fatais. No Brasil, a triagem neonatal teve início em 1976, por meio de um projeto da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de São Paulo (Apae-SP) para detecção da fenilcetonúria. Nas décadas de 1970 e 1980, os exames se disseminaram e, em 1992, o Ministério da Saúde (MS) publicou portaria incluindo a triagem neonatal da fenilcetonúria e do hipotireoidismo no Sistema Único de Saúde (SUS).  O Programa Nacional de Triagem Neonatal do SUS avançou nos últimos anos e, em 26 de maio de 2021, foi sancionada a Lei 14.154, que ampliou para mais de 50 o número de doenças identificadas por meio do teste do pezinho. Essa ampliação está sendo realizada de forma escalonada em cinco etapas e os erros inatos da imunidade fazem parte da quarta.

A Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras (PNAIPDR) e as Diretrizes para Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras no campo do SUS foram instituídas pelo MS por meio da Portaria GM/MS nº 199 de 2014 (depois consolidada no Anexo XXXVIII da Portaria de Consolidação nº 2 de 2017), com o objetivo de reduzir a morbimortalidade e melhorar a qualidade de vida dos indivíduos com DRs por meio da promoção, prevenção, detecção precoce, tratamento oportuno, redução de incapacidades e cuidados paliativos. Essas ações permitiram a habilitação de serviços especializados em DRs no Brasil e da rede de cuidados às pessoas que apresentam deficiência. Atualmente, mais de 30 Centros de Referência ou Serviços de Atenção Especializada em DRs já foram habilitados pelo MS, mas ainda há um longo caminho a percorrer para garantir uma cobertura adequada em todo o país. A escassez de profissionais capacitados, como médicos geneticistas e imunologistas, é um dos entraves para o atendimento especializado, dificultando o diagnóstico precoce e o manejo adequado dessas condições.

A PNAIPDR, a organização dos serviços e o avanço das tecnologias para o diagnóstico e tratamento das DRs fizeram emergir a necessidade de conhecermos dados epidemiológicos, recursos diagnósticos e custos dessas doenças no Brasil. Nesse contexto, foi criada em 2020 a Rede Nacional de Doenças Raras (RARAS), um projeto multicêntrico, que está conduzindo um inquérito nacional sobre a frequência, quadro clínico, recursos diagnósticos e custos das DRs. O objetivo da RARAS é consolidar dados epidemiológicos e clínicos para subsidiar políticas públicas mais eficazes e direcionar recursos de forma estratégica.

A Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) tem desempenhado um papel importante na transformação do cenário das DRs no Brasil, por meio da criação do Departamento Científico de Erros Inatos da Imunidade e, recentemente, de angioedema hereditário e da Diretoria de Políticas de Saúde, e pelo fomento à educação continuada de seus associados e publicação de diretrizes. Além dessas ações, a ASBAI realiza anualmente o Fórum SUS, que inclui discussões sobre a assistência às DRs no Brasil. A Associação mantém diálogo com o MS, participando ativamente de reuniões estratégicas sobre o tema e contribuindo nas consultas públicas que avaliam a incorporação de tecnologias para diagnóstico e tratamento, tanto no SUS quanto na Saúde Suplementar.

O Dia Mundial das Doenças Raras é um momento para reforçar a necessidade de investimentos em pesquisa, estruturação de centros especializados, acesso a exames diagnósticos e tratamentos inovadores, e também capacitação de profissionais. A participação ativa das sociedades de especialidades, especialistas e da população em geral é essencial para promover avanços na área. O envolvimento de diferentes setores da sociedade fortalece a mobilização por políticas públicas eficazes, amplia a disseminação do conhecimento e fomenta a criação de redes de apoio para os pacientes e suas famílias.

A colaboração entre médicos, pesquisadores, associações de pacientes e gestores de saúde pode acelerar o acesso a novas tecnologias, melhorar o manejo clínico e proporcionar um futuro melhor para os brasileiros que convivem com DRs.

Juntos podemos avançar na construção de um sistema de saúde mais inclusivo e preparado para atender os pacientes com DRs.

Quer saber mais sobre doenças raras no Brasil?

https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/saes/doencas-raras

https://raras.org.br/

de Oliveira BM, Bernardi FA, Baiochi JF, Neiva MB, Artifon M, Vergara AA, et al.Epidemiological characterization of rare diseases in Brazil: A retrospective study of the Brazilian Rare Diseases Network. Orphanet J Rare Dis 19, 405 (2024).

* Faradiba Sarquis Serpa é diretora de Políticas de Saúde da ASBAI