EDITORIAL | Mês da Rinite e da Dermatite Atópica
Os futuros biomarcadores da rinite
Por Dra. Maria Cândida Rizzo*
Setembro nos remete ao Dia Nacional da Rinite e à Conscientização da Dermatite Atópica. Por isso, venho discutir possibilidades em diagnóstico e em abordagens terapêuticas na rinite alérgica (RA).
A rinite alérgica é uma patologia com alta prevalência mundial, de diagnóstico clínico, que se inicia principalmente da infância ao adulto jovem, caracterizada por sintomas como prurido nasal/ocular, espirros, obstrução nasal e coriza, fora de eventos infecciosos. A ocorrência de RA afeta sobremaneira o lazer, o trabalho, a educação e a qualidade de vida dos pacientes, com grande perda econômica para a sociedade. A RA é uma patologia inflamatória crônica, envolvendo a destruição da barreira epitelial nasal e da barreira física e a intensificação de respostas T2.
As vesículas extracelulares pequenas (VEs) e os microRNAs (miRNAs) têm se tornado objetos de interesse em processos inflamatórios crônicos (como a rinite alérgica) devido a seu papel regulatório em várias outras patologias crônicas, incluindo algumas manifestações de câncer.
Uma das formas de comunicação intercelular ocorre pela secreção de VEs, que transportam cargas bioativas e são transferidas entre a fonte e as células-alvo, modificando seu comportamento.
As VEs são compostas de duas camadas lipídicas com diâmetro máximo de 150 nm. São secretadas por uma variedade de células pelo processo de endocitose, fusão e exocitose. De acordo com seu mecanismo de liberação e de seu tamanho, há três tipos descritos de VEs: os exossomos (< 150 nm de diâmetro), as microvesículas e os corpos apoptóticos, ambos > 100 nm. Os exossomos são vesículas liberadas ao ambiente extracelular após sua fusão com os endossomos/corpos multivesiculares com a membrana plasmática (Figura 1).
Biogênese das vesículas extracelulares pequenas (VEs): a formação dos exossomos se inicia com a endocitose (A), resultando em um endossomo precoce (B) que sofre maturação para um endossomo tardio. Nessa maturação, o endossomo tardio recebe cargas do complexo de Golgi (C). A atuação das cargas vai originar as vesículas intraluminais (ILVs) e, na sequência, os corpos multivesiculares (MVBs) (D). Parte dos MVBs se dirige aos lisossomos para degradação (E) ou se dirige à membrana plasmática (F), onde se funde e libera as ILVs, agora chamadas exossomos (G).
As VEs são derivadas principalmente de células-tronco hematopoéticas, células epiteliais e células tumorais, e existem em vários tecidos e fluidos humanos. Observa-se que, quanto maior o processo inflamatório, maior o nível secretado de VEs. Devido à sua estrutura lipídica, carreiam miRNAs, DNA e outras substâncias.
As vesículas extracelulares pequenas atuam na transmissão de sinais e mediam a troca de informação intercelular, com grande utilidade no diagnóstico, no tratamento e na avaliação prognóstica de uma série de patologias. Há estudos evidenciando que VEs plasmáticas de pacientes com RA exibem características de apresentação antigênica e promovem a diferenciação de linfócitos Th2.
Os miRNAs são RNAs pequenos, entre 18 a 24 nucleotídeos, não codificantes, que regulam a expressão gênica e ocupam importantes funções em atividades biológicas.
Os miRNAs regulam a expressão gênica ligando-se ao RNA mensageiro-alvo e induzindo a degradação do RNA ou o bloqueio da síntese proteica. A liberação de miRNAs apresenta-se desregulada em várias doenças, como o câncer, artrite reumatoide, asma, rinossinusite crônica e RA. Os miRNAs circulantes poderiam, portanto, ser usados como biomarcadores na desregulação de doenças alérgicas.
O miRNA-155 está envolvido na patogênese da RA, uma vez que sua expressão está aumentada em múltiplas linhagens de células do sistema imunológico, incluindo linfócitos T, linfócitos B, mastócitos, fibroblastos, macrófagos e células dendríticas. Além disso, o CTLA-4, que se liga à CD28 e bloqueia a ativação de linfócitos T efetores, é um reconhecido alvo para o miRNA-155. Alguns estudos sugerem que a inibição de CTLA-4 pelo miRNA-155 leva à estimulação de linfócitos T efetores na pele de pacientes com dermatite atópica.
Considera-se que o miRNA-375 também ocupa um importante papel nas doenças alérgicas Th2, estando diminuído na RA, ocasionando maior apoptose das células da mucosa nasal. Nesses pacientes, há uma desregulação das células linfoides do tipo 2 (ILC2) pela maior expressão de linfopoetina do estroma tímico (TSLP) e maior sinalização da via JAK2/STAT3.
A utilização de miRNA-375 pode se tornar uma arma terapêutica em RA, à medida que poderia prevenir as células da mucosa nasal de sofrerem apoptose e melhorar a RA por inibição da via de sinalização JAK2/STAT3 (Figura 2).
Regulação das vesículas extracelulares pequenas (VEs) e dos miRNAs na rinite alérgica. Adaptado de Yiting Liu et al, 2022
Como conclusão das linhas de pesquisa quanto a possibilidades terapêuticas em RA, as VEs e os miRNAs demonstram papel regulatório na patogênese da doença, pelo controle da comunicação intercelular, além de controle na proliferação, diferenciação e apoptose celular. As VEs e os miRNAs muito provavelmente ocuparão papel futuro como biomarcadores e como terapias-alvo na RA, pelo uso de nanomateriais cobertos de determinados miRNAs e VEs, de liberação lenta.
*Dra. Maria Cândida Rizzo é coordenadora do Departamento Científico de Rinite da ASBAI
SCORAD e/ou EASI: um dos dados mais relevantes para o melhor manejo da dermatite atópica
Por Dr. Evandro Prado*
A dermatite atópica é uma doença inflamatória da pele, de caráter crônico e recidivante, acometendo principalmente crianças e adolescentes e sendo mais frequente em indivíduos com história familiar de atopia.
Geralmente é a primeira manifestação clínica da marcha atópica e tende a desaparecer antes da adolescência. Pode se iniciar em qualquer idade, acompanhando ou não as manifestações respiratórias como rinite e asma.
A dermatite atópica é uma doença caracterizada por alteração da barreira cutânea e desregulação imunológica. Sempre foi considerada uma doença “inside out” e, em função dos conhecimentos mais atuais, passou a ser considerada “outside in”.
Ação excessiva de proteases destruindo corneócitos de maneira acelerada, mutações do gene da filagrina e menor expressão de proteínas de junção são algumas das causas que levam a uma alteração da barreira cutânea. Consequências importantes são a diminuição da camada lamelar lipídica e a possibilidade de penetração de alérgenos e patógenos. Disbiose microbiana ao nível do estrato córneo é outro fator etiológico que explica a maior frequência de infecções cutâneas predominantemente estafilocócicas.
A penetração de alérgenos parece ser o fator mais importante para explicar o início de uma resposta imunológica distorcida envolvendo um grande número de células e produtos celulares com funções pró-inflamatórias. Citocinas como a TSLP, IL25 e IL33, ditas alarminas, estimulam células TH1, TH2, TH17 e TH22, assim como representantes da resposta imune inata como a ILC2. As respostas TH2 e ILC2 caracterizam o que chamamos hoje de resposta inflamatória T2.
As características clínicas essenciais são o prurido e a presença de lesões eczematizadas agudas, subagudas e crônicas. As lesões do ponto de vista morfológico são variáveis: eritema, pápula, vesícula, crostas e liquenificação.
A ausência de achados laboratoriais ou histológicos torna o diagnóstico exclusivamente clínico.
Um dos dados mais relevantes para um melhor manejo da doença é a possibilidade de acessarmos a gravidade por meio de ferramentas como o SCORAD e/ou EASI.
O tratamento deve ser personalizado e se baseia em cuidados gerais, hidratantes, corticosteroides ou inibidores de calcineurina tópicos. A prescrição de imunossupressores sistêmicos está indicada nos casos mais graves, quando a terapia convencional não resulta em controle da doença ou melhora das lesões cutâneas.
Recentemente foram acrescentados ao nosso arsenal terapêutico os imunobiológicos e os inibidores de pequenas moléculas. A diminuição do prurido e melhora do aspecto da pele podem ser observados no início do tratamento.
Anti-histamínicos não são considerados medicamentos de primeira linha e as dietas de exclusão estão reservadas em casos graves e, principalmente, nas crianças de baixa idade.
O objetivo maior é o controle da dermatite atópica, proporcionando melhor qualidade de vida para o paciente e seus familiares.
*Dr. Evandro Prado é coordenador do Departamento Científico de Dermatite Atópica da ASBAI